O artigo 227 é o único da Constituição Federal de 1988 que usa o termo “absoluta prioridade” ao tratar de crianças e adolescentes. Trata-se de pouco mais de 53 milhões de brasileiros com menos de 18 anos de idade. Apesar disso, os gastos da União voltados para esse público representam menos de 5% do orçamento total e têm caído nos últimos anos. Como colocá-lo no centro do investimento social privado e público foi o tema principal da mesa “Filantropia e Políticas Públicas pelo fortalecimento dos direitos de crianças e adolescentes”, durante o 12° Congresso GIFE – Desafiando as Estruturas de Desigualdades, evento realizado do dia 12 a 14 de abril em São Paulo.
A mesa contou com mediação do Presidente do IBDCRIA, Raul Araújo, e participação do secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ariel de Castro Alves, da secretária de Assistência Social e Articuladora Municipal do Selo Unicef, Francinéa Dias, da diretora-executiva no Alana, Isabella Henriques, do secretário-executivo na Coalizão pelo Fim da Violência, Lucas Lopes, e da diretora executiva na ANDI – Comunicação e Direitos, Miriam Pragita.
De acordo com o Inesp, durante os anos de 2019 e 2021, os recursos destinados para combater o trabalho infantil foram reduzidos em 20 vezes; houve queda de 28% no valor destinado à assistência social a este público; e encolhimento de 77% do orçamento voltado para a educação infantil. “O governo Bolsonaro desmantelou Conselhos Municipais da Criança e do Adolescente, orçamentos e políticas públicas de ações afirmativas e de participação popular. Estamos agora em um processo de reconstrução. E esse processo tem que ser transversal e voltado para a proteção de crianças e adolescentes”, afirmou Ariel de Castro Alves.
Em destaque:
- As crianças e adolescentes são os grupos mais vulneráveis e as mais atingidas pelas desigualdades estruturais, como a racial, de gênero e social.
- O fortalecimento do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e dos Conselhos da Criança e do Adolescente é a base da criação de políticas públicas para pessoas com menos de 18 anos.
- O Investimento Social Privado deve ser intencional e considerar a transversalidade das pautas ao executar ou apoiar um projeto voltado para este grupo.
Crianças e adolescentes são seres de direitos. As leis brasileiras asseguram à elas o direito à vida e à saúde; à liberdade, ao respeito e à dignidade; à convivência familiar e comunitária; à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer; e à profissionalização e à proteção no trabalho.
Entretanto, ainda falta muito para que essas garantias sejam, de fato, asseguradas no país.
De acordo com o UNICEF, desde 2015, as coberturas vacinais – que vinham se mantendo em patamares de excelência – entraram em uma tendência de queda. De 2015 a 2019, a cobertura vacinal da poliomielite caiu de 98,29% para 79,42%, e a da tríplice viral, de 96,07% para 91,57% (PNI).
Segundo o Ministério da Saúde, em 2018, a prevalência de desnutrição crônica entre crianças indígenas menores de 5 anos era de 28,6%. Os números variam entre etnias, alcançando 79,3% das crianças Yanomâmis.
Na questão da segurança, isso não é diferente. “Durante este nosso bate papo de cerca de 1h30 de duração, nove crianças serão vítimas de violência sexual no país. A cada dia, sete são mortas de forma violenta, em sua maioria crianças e adolescentes negros. A iniciativa privada, o Poder Público e a sociedade civil precisam enfrentar as desigualdades de forma estrutural e reconhecer crianças e adolescentes como seres de direitos”, comentou Lucas Lopes.
Parte importante desse processo é o fortalecimento do Instituto da Criança e do Adolescente (ECA) e dos Conselhos da Criança e do Adolescente que, assim como outros conselhos, foram desmantelados no governo anterior. De acordo com o IPEA, o governo Bolsonaro reduziu de 700 para menos de 50 em seu segundo ano de mandato.
Para reconstruir as políticas públicas voltadas para a criança e o adolescente, entretanto, é necessário verificar os gargalos e necessidades mais urgentes, tanto no âmbito nacional quanto na esfera dos municípios, conforme destaca Francinéa Dias. “É importante conduzir diagnósticos para mobilizar recursos com mais assertividade, seja de forma macro ou territorial.”
Agenda 277
A Agenda 227 é um exemplo de como a sociedade civil tem se organizado para a garantia desses direitos.
“É um movimento criado em defesa das crianças e adolescentes que conta atualmente com aproximadamente 400 organizações signatárias”, explicou Miriam Pragita.
Uma das principais ações deste movimento foi o “Plano País para a Infância e a Adolescência”, conjunto de propostas apresentadas a todas as candidaturas à Presidência da República durante as eleições de 2022, de forma a monitorar e pressionar o Poder Público a adotar medidas de proteção que garantam os direitos de pessoas na infância e adolescência.
“A sociedade civil, por meio da Agenda 227 e outros movimentos, já conquistou marcos importantes, como a volta das condicionalidades no Bolsa Familia e revogação dos atos que violavam o direito das crianças como o decreto 10.202. Esse pacto urgente em prol das crianças e adolescentes entre todos os setores é fundamental”, completou Isabella Henriques.
De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE — Desafiando Estruturas de Desigualdades — debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade.
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Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.