O papel da filantropia na articulação entre bioeconomia e populações tradicionais

Mesa durante o 12º Congresso GIFE debateu como o investimento social privado pode realocar recursos de bioeconomia de forma eficiente para povos originários.

A bioeconomia já é uma realidade no investimento para o desenvolvimento sustentável.  Diante da necessidade de um novo modelo econômico que respeite a floresta e as pessoas que vivem nela, como as organizações sociais podem pautar o combate às desigualdades no campo da sustentabilidade? 

Esta foi a discussão central da mesa ‘Bioeconomia como caminho para o desenvolvimento sustentável’, que aconteceu no primeiro dia do 12º Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades. Os palestrantes abordaram o papel da filantropia e do investimento social privado (ISP) na promoção da justiça socioambiental, principalmente entre povos indígenas e quilombolas.

Greta Salvi, mediadora da mesa e diretora da Latimpacto, destacou que o debate sobre bioeconomia precisa ter o envolvimento dessas populações como ponto de partida. “Não existe desenvolvimento sustentável sem pessoas. Esse é um tema que tem despertado interesse porque gera muitas oportunidades de manter a floresta em pé. A bioeconomia é uma alternativa, mas precisamos colocar os povos originários no centro dessa discussão.”

Confira os principais temas abordados

  • Bioeconomia é o espaço para debater recursos e criar alternativas sustentáveis frente às atividades predatórias do meio ambiente.
  • Não há desenvolvimento sustentável sem pessoas, o que implica compreender a complexidade das comunidades nas áreas de preservação.
  • A implementação da bioeconomia no Brasil pode gerar um faturamento industrial anual de US$ 284 bilhões até 2050.
  • Em 2022, foram 11.568 km² de desmatamento somente na Amazônia – equivalente a duas vezes a área do Distrito Federal.

 

O estudo “Potencial do impacto da bioeconomia para a descarbonização do Brasil”,, mostrou que a implementação da bioeconomia no Brasil pode gerar faturamento anual de US$ 284 bilhões até 2050. Diante das enormes perspectivas de crescimento, a maior complexidade não é mais a quantidade de recursos disponíveis para investimento. Conforme aponta Sérgio Leitão, ativista ambiental e fundador do Instituto Escolhas, “a questão é como fazer o recurso chegar às comunidades”, destacando a união entre o conhecimento dos povos tradicionais e os recursos da filantropia como principal saída para enfrentar os desafios da sustentabilidade. 

Nesse sentido, Selma Dealdina, secretária administrativa da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e Vice-Presidenta do Conselho Deliberativo do Fundo Casa Sociambiental , concorda que existem dificuldades em contar com financiamento público para a proteção dos biomas e, por isso, destaca o papel da filantropia nesse contexto. “Quando vocês lançam um edital no valor de 30 mil reais, pode parecer pouco para vocês. Mas com esse dinheiro a gente fura um poço e faz chegar água para muita gente. Isso transforma a realidade das pessoas.”

Colocar as comunidades indígenas e quilombolas, tradicionais guardiãs das florestas, no centro da discussão, é não apenas chamá-las  para o debate, mas compreender que os processos de tomada de decisão devem ser também ocupados por elas. “Não podemos colonizar a floresta com os ideais de São Paulo”, enfatizou Ellen Acioli, coordenadora do Programa Vozes pela Ação Climática Justa na Fundación Avina. O principal desafio na promoção da bioeconomia passa por garantir que o desenvolvimento sustentável não faça da Amazônia um celeiro de grandes empresas: “Existem povos indígenas trabalhando com bioeconomia por vontade própria. Mas também existem grandes empresas que se aproximam das comunidades para forçar uma situação. O primeiro passo é saber se os povos desejam fazer parte disso tudo.”

Uma estimativa divulgada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostrou que, em 2022, foram 11.568 km² de desmatamento somente na Amazônia – equivalente a duas vezes a área do Distrito Federal. Na média, o governo de Jair Bolsonaro permitiu a destruição de 11.396 km² da floresta por ano. Nesse contexto, Ellen Acioli, que é indígena autodeterminada do povo Sateré Mawé, lembra que não se pode tratar de bioeconomia sem falar sobre direitos humanos. “Quem faz a extração dos bioativos são pessoas que precisam do seu território protegido para viver”. 

Potencial da bioeconomia amazônica no combate à pobreza

A Amazônia Legal, denominação para os nove  estados que compartilham o território da Floresta Amazônica brasileira, corresponde a cerca de 60% do território nacional. Dessa forma, o investimento em projetos com foco na sustentabilidade pode garantir o desenvolvimento econômico do país. Um estudo realizado pelo Instituto Escolhas calcula que a recuperação de 5,9 milhões de hectares de florestas no Pará tem o potencial de gerar R$13,6 bilhões de e reduzir em 50% o índice de pobreza no estado. 

Por este motivo, segundo Márcia Soares, líder de Parcerias e Redes do Fundo Vale, a proteção da floresta depende do entendimento das complexidades do território. “Já entendemos que o desmatamento não trouxe o desenvolvimento prometido. Não existe empresa de sucesso em território falido. A Amazônia precisa de uma mobilização que altere esse percurso”.

E é justamente nessa mobilização que está o papel da filantropia: escutar as comunidades tradicionais e fazer com que os recursos cheguem até as regiões que mais necessitam. “Se as entidades que compõem o GIFE estão dispostas a discutir desigualdade, então estamos criando um espaço de diálogo para enfrentar esse problema. É essa mudança que buscamos há 523 anos no Brasil”, enfatizou Selma Dealdina, lembrando que os quilombos sempre fizeram bioeconomia, muito antes da existência do termo. 

 

De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE — Desafiando Estruturas de Desigualdades — debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade. 

Se este tema te interessou, clique aqui e confira a cobertura completa do evento.

Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.

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