Decolonização, o próximo passo para o investimento social

Filantropia e instituições financeiras devem ter atuação direta no apoio a projetos de combate ao racismo,  defende Edgar Villanueva, fundador da Decolonizing Wealth

Representantes de organizações do investimento social privado e da filantropia têm alto potencial para atuar de forma mais ampla e longeva em prol das mudanças necessárias para a  sociedade. Este ano, o 12º Congresso GIFE – Desafiando as Estruturas de Desigualdade traz a provocação: será que estamos fazendo o suficiente para combater as estruturas da desigualdade? 

Edgar Villanueva, fundador da Decolonizing Wealth e palestrante da plenária que dá nome ao evento, propõe a conscientização sobre os  efeitos da colonização na filantropia. Ele defende uma guinada rumo ao caminho inverso — a decolonização — como essencial para combater as desigualdades de forma plena.  “A ideia de decolonização é entender que pessoas negras, brancas e indígenas devem olhar para o passado e nos comprometer com o processo de cura”, afirmou durante o primeiro dia do evento.

Confira um resumo do que foi dito na palestra

  • A colonização é um processo que impede que minorias étnicas tenham acesso pleno a direitos básicos
  • O investimento privado como ator fundamental para combater desigualdades em espaços de  poder
  • Filantropia e governo devem atuar de forma conjunta por justiça socioambiental

As estruturas da desigualdade racial

Durante o período de escravidão, cerca de 4 milhões de  pessoas foram sequestradas do continente africano e  trazidas para o Brasil. Isso representa um terço de todo o tráfico negreiro.. A colonização também foi responsável por expropriar terras e riquezas de povos indígenas, que até hoje têm seus territórios e existência ameaçados. Estas estruturas de formação social ainda são as maiores barreiras no caminho pela diminuição das diferenças sociais, econômicas e raciais no país.

Durante seu discurso na plenária “Desafiando Estruturas de Desigualdades”, Edgar Villanueva afirmou que o processo de decolonização deve ter atuação direta da filantropia e instituições financeiras. A fim de promover a equidade racial, o investimento social privado pode e deve atuar diretamente em linhas de investimento que tenham o combate ao racismo como principal foco. Mas não deve parar por aí. 

Por exemplo, os espaços de decisão da filantropia ainda são ocupados majoritariamente por pessoas brancas. Segundo o Censo GIFE 2020, 55% dos conselhos deliberativos das organizações são compostos apenas por pessoas brancas. Isso mostra que ainda existe um longo caminho para que as pessoas mais afetadas pelas desigualdades ocupem os espaços de decisão. Dentro do investimento social, uma visão ampla, para além do assistencialismo e que considere a descolonização da distribuição de recursos é o caminho, segundo Villanueva.

“Continuar focando nas questões raciais é o ponto principal, apontando as verdades históricas e falando sobre isso de maneira contínua. Mais do que isso, atuar na prática para que essa relação histórica seja feita. Compartilhar o dinheiro com as comunidades e pessoas das periferias. Supremacia branca é um conceito, uma filosofia que foi construída para destruir e machucar as pessoas não brancas. Temos de desconstruir essa ideologia que é parte intrínseca das organizações políticas.” 

Transversalidade pela justiça socioambiental

Apesar do desafio, o debate sobre concentração de renda deve começar entre aqueles que detém a riqueza do mundo. No último Fórum Econômico Mundial, em janeiro deste ano,  um grupo de empresários milionários se posicionou a favor do fim das desigualdades extremas. Na ocasião, nenhum representante do Brasil fez parte da iniciativa.

Este movimento, ainda que pequeno, pode significar uma mudança necessária nas estruturas do investimento social privado. De acordo com o documento Global Wealth Report, do banco Credit Suisse, a concentração de riqueza global aumentou durante a pandemia. Trazendo este recorte para o Brasil, em 2021 a parcela da população que representa o 1% mais rico detinha 49,3% da renda.

Neste sentido, o investimento social privado e a filantropia não devem substituir o poder público. Na verdade, as duas frentes devem trabalhar em conjunto. Entre 2020 e 2021, 11,6 milhões de brasileiros passaram a viver abaixo da linha da pobreza, segundo o IBGE. O cenário exige que as respostas venham de forma conjunta e transversal.

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, enviou sua fala em vídeo. Para ela, a superação da miséria só será possível com a ação conjunta entre filantropia e governo. “Com 33 milhões de brasileiros em situação de pobreza extrema e também dos povos indígenas, com a contaminação dos rios, dos peixes, causados pelo garimpo, faz com que o Brasil fique numa situação degradante em relação aos direitos humanos desses povos”.

O último relatório do IPCC demonstrou que a injustiça climática já é uma realidade: mudanças climáticas afetam mais as populações mais vulneráveis. Eventos climáticos extremos, como as enchentes no Maranhão e os deslizamentos de terra no litoral de São Paulo ilustram este cenário.

De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE — Desafiando Estruturas de Desigualdades — debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade. 

Se este tema te interessou, clique aqui e confira a cobertura completa do evento.

Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.

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