Debate sobre o papel do investimento social familiar na construção da justiça social aconteceu no último dia do Congresso GIFE
Famílias que estruturam institutos e fundações, em geral, buscam propagar valores e deixar seus legados. Neste sentido, o investimento social familiar atua em diversas frentes: do financiamento à sociedade civil organizada àqueles que operam seus próprios projetos. O debate com foco no papel filantropia familiar e nas suas diversas formas de atuação aconteceu na mesa “Alcances e desafios da Filantropia Familiar na redução de desigualdades”, durante o terceiro dia do 12º Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades.
Participaram da mesa Beatriz Bracher, fundadora do Instituto Galo da Manhã; Bianca Santana, diretora-executiva da Casa Sueli Carneiro; Juliano Salgado, vice-presidente do Instituto Terra; e Luciano Cerqueira, coordenador de projetos da Samambaia.org. A mediadora Inês Lafer, presidente do conselho do GIFE, provocou os participantes: “Estamos acostumados a colocar a filantropia só no lugar do privilégio, mas é importante também pensar nela como uma construção coletiva.”
Em destaque:
- O apoio e a criação de fundações familiares contribuem na construção e divulgação dos acervos criados por grupos historicamente marginalizados.
- A filantropia consegue desburocratizar o processo de critério na escolha na distribuição de recursos.
- Mudar a forma e tributação entre os mais ricos é a possibilidade de arrecadar recursos para políticas de combate à desigualdade.
A publicação Perspectivas para a Filantropia no Brasil, lançada este ano pelo Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), trouxe perspectivas de como o investimento privado pode agir de forma estratégica, efetiva e ágil. Sob o viés da filantropia familiar, o documento convocou as fundações e indivíduos a firmar compromissos públicos em suas práticas de doação.
Construindo legados
“Quando olhamos para filantropia familiar, também precisamos pensar no acervo que aquela família deixa à disposição da sociedade”, disse Inês Laffer ao dar início ao debate. Já Bianca Santana respondeu que o investimento social privado precisa dar mais atenção aos legados de pessoas historicamente marginalizadas como critério de doação de recursos.
A produção intelectual da escritora e filósofa Sueli Carneiro, por exemplo, está disponível na Fundação que leva seu nome. As pesquisas da autora podem contribuir no enfrentamento às desigualdades sob a perspectiva afrocentrada e feminista. E, para que isso seja possível, “o dinheiro do investimento social privado e da filantropia tem sido fundamental”, pontuou Bianca Santana. Em concordância, Beatriz Bracher complementou: “O incentivo à cultura dá autonomia intelectual para as pessoas. E este é o fator que evita a formação do movimento fascista”.
Uma semente faz diferença
Ações de mobilização e financiamento social podem começar de forma individual. O engajamento comunitário muitas vezes começa pela criação de legados de lideranças que fortalecem suas comunidades e ecossistema. Como exemplo, Bianca Santana relembrou o trabalho que sua avó fazia em uma horta comunitária, além da distribuição de cestas básicas para vizinhos: “já era, também, filantropa.”
Dando um passo além, as famílias estão cada vez mais cientes de seu papel como cidadãos que podem contribuir para a redução das desigualdades, aplicando recursos de maneira estratégica para além de ações pontuais e assistencialistas. O Instituto Terra, por exemplo, teve início com o reflorestamento de uma propriedade particular, hoje tem 2072 hectares recuperados, explicou Juliano Salgado. O que começou como um projeto de embelezamento, hoje tem impacto sustentável na vida de toda comunidade ao redor: “Nos demos conta que precisávamos impactar positivamente a vida das pessoas trabalhando nessa recuperação. Por isso, incluímos a transformação social nos nossos valores.”
“Filantropia sempre tem a ver com política”
Sob o entendimento geral de que o combate às desigualdades passa obrigatoriamente pelo fortalecimento da democracia, Beatriz Bracher trouxe o viés político para o debate. A escritora reforçou que os investimentos devem priorizar organizações que contribuam com incidências políticas efetivas: “Discutir objetivos, como alcançá-los, quem atingir, quais os critérios de seleção. Esse é o tipo de conversa que toda instituição de filantropia deve ter.”
Já na perspectiva de políticas financeiras, existe um movimento que defende a “transformação tributária para o crescimento regenerativo”. Em outras palavras, o conceito trazido por Luciano Cerqueira entende que mudanças no imposto de renda e em outros impostos, como sobre consumo, taxação de grandes fortunas e de heranças, podem ajudar a União na arrecadação para construção de políticas públicas.
A conta é simples, segundo Luciano: “Se o governo arrecada mais, o Brasil consegue ter um crescimento econômico sustentável e assim conseguimos combater a desigualdade. Não adianta tentar combater as desigualdades sem recursos.”
De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade. Se este tema te interessou, clique aqui e confira a cobertura completa do evento.
Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.