“A filantropia não ocupa um lugar messiânico. Ela não existe para salvar nada, mas para contribuir com uma potência já existente”, provoca Graciela Hopstein, da Rede Comuá.
O desafio de conjugar diferentes interesses em um ambiente de múltiplos atores foi o tema de destaque da mesa “Filantropia comunitária: mobilização de atores diversos para a transformação”, que recebeu no primeiro dia do Congresso 2023 do GIFE Harley Henriques, do Fundo Positivo, Jair Resende, da Fundação FEAC, Larissa Amorim, da Casa Fluminense, e Vinicius Ahmar, do Instituto Arapyaú, com mediação de Graciela Hopstein, gestora da Rede Comuá.
O propósito da filantropia comunitária, estratégia de resistência que vem sendo praticada há dois séculos no Brasil, é um só: desenvolver comunidades e solucionar vulnerabilidades a partir de sua própria visão de prioridades e potenciais soluções e por meio de recursos e potencialidades locais.
“É importante identificarmos as pautas prioritárias a partir das demandas e peculiaridades de cada território, buscando dar protagonismo a quem está na ponta e a minorias políticas”, defende Harley Henriques, do Fundo Positivo.
Em destaque:
- A premissa básica da filantropia comunitária é conferir poder e autonomia para as comunidades.
- Os investimentos devem priorizar a agenda de políticas públicas de modo a fortalecer processos democráticos.
- A articulação de múltiplos atores apesar de complexa é o que garantirá a legitimidade dos investimentos.
- Um dos desafios ao dialogar com os coletivos e movimentos é a burocratização de processos. Por isso, é fundamental o fortalecimento institucional das organizações locais.
Sobre este último tópico, Jair Resende, da Fundação FEAC, defende que todo projeto financiado deveria separar 15% do total para esta finalidade.
Um dos pontos mais sensíveis à implementação da filantropia comunitária se dá justamente na transferência de poder às comunidades, o que necessariamente implica um fator político. Não é sobre impor formas de atuação e agendas, como bem exemplificou Larissa Amorim, da Casa Fluminense.
Há dez anos, a instituição atua como um polo de uma rede de organizações para a construção coletiva de políticas e ações públicas para a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, com foco na redução das desigualdades, no aprofundamento da democracia e no desenvolvimento sustentável.
A organização lança anualmente um edital público a partir de um fundo comunitário que seleciona iniciativas com base em uma agenda de políticas públicas construídas a partir das demandas dos territórios. “É preciso pensar processos de incidência política a partir de uma filantropia associada a políticas públicas que fortaleçam a democracia”, afirma.
Recentemente, a Casa Fluminense anunciou uma aliança de fundos para ampliar a atuação nos territórios, articular mais atores e promover trocas de experiências. Para além dos 22 municípios de sua atuação direta, a aliança abarca mais de 170 municípios. Em 2021 foram levantados mais de R$ 3 milhões destinados a apoiar 936 projetos.
Não há solução trivial para problemas complexos
“A única forma de lidar com o caráter multifacetado e complexo dos problemas que encontramos nos territórios é somar visões”, diz Vinicius Ahmar, do Instituto Arapyaú. Desde a sua fundação, em 2008, o instituto atua em rede com múltiplos parceiros, comunidade e poder público, além de contribuir com o fomento da Agência de Desenvolvimento Regional Sul da Bahia, que atua de maneira mais ampla no território.
As ações do Arapyaú se concentram no sul da Bahia nos municípios de Itacaré, Uruçuca, Ilhéus, Itabuna, Una e Canavieira, em particular no apoio ao desenvolvimento econômico da região por meio do fortalecimento e dinamização da cadeia de cacau cabruca.
Uma das formas de promover a viabilidade e a sustentabilidade econômica é a concessão de créditos para projetos de organizações da sociedade civilIsso é feito a partir do CRA Sustentável, projeto pioneiro de crédito rural sustentável no Brasil, concebido em 2020 pela ONG Tabôa em parceria com os institutos Arapyaú e humanize e o Grupo Gaia.
O programa, que já beneficiou mais de 200 famílias, venceu o edital do BNDES em 2022 e receberá, no total, um aporte de R$ 4 milhões para financiar eventuais perdas e dar assistência técnica aos beneficiados na próxima rodada do crédito, prevista para meados de 2023. “Os recursos oriundos da filantropia são ainda limitados, por isso precisam ser usados estrategicamente de modo a alavancar mais recursos”, aponta.
De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE — Desafiando Estruturas de Desigualdades — debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade.
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Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.