Investimentos e programas sociais que não avaliam os impactos em determinados grupos sociais produzem evidências limitadas e parciais, e podem ser ferramentas de perpetuação de desigualdades
Analisar o impacto de programas sociais é extremamente necessário para adquirir conhecimento sobre os seus avanços, retrocessos e desafios. Entretanto, esta leitura deve sempre ter a perspectiva da equidade, especialmente em um país marcado por abismos sociais. Esta foi a conclusão da mesa “Avaliações promotoras de equidades: o que fazemos e o que precisamos?”, do 12° Congresso GIFE – Desafiando as Estruturas de Desigualdades.
A conversa contou com mediação da coordenadora da Agenda de Avaliação no GIFE, Camila Cirillo e participação da gerente executiva de Gestão do Conhecimento e Impacto na Liga Solidária, Lívia Magro; da secretária adjunta de Monitoramento e Avaliação do Governo Federal, Mirela de Carvalho; da sócia da Move Social, Walquíria Tibúrcio; e do diretor da Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação (RBMA), Wesley Matheus.
Em destaque:
- No Brasil não há impacto social sem equidade racial. Por isso, as metodologias devem avaliar a promoção da equidade nos projetos sociais.
- Metodologias de avaliação não são processos puramente técnicos, mas também políticos.
- Os processos atuais de avaliação são pouco provocados a construir perspectivas antirracistas.
As avaliações nunca são neutras, explicou Mirela de Carvalho, já que são feitas por pessoas com pontos de vista e histórias próprias. “É extremamente importante contarmos com um time diverso de avaliadores. Por ser um processo enviesado, temos que garantir diversidade de olhares e de perfis para, assim, contemplarmos várias perspectivas”, comentou.
Mensurar o impacto de projetos sociais na equidade racial é urgente
Herança de quase 400 anos de escravidão, o racismo estrutural é uma das principais causas da desigualdade social brasileira. Dados do IBGE, referentes a 2019, revelaram uma diferença gritante. Entre a população que se declarava branca, 3,4% eram extremamente pobres e 14,7% eram pobres, menos da metade do verificado entre pretos e pardos. O levantamento também mostrou que entre os 10% mais ricos, apenas 27,7% são pretos ou pardos; enquanto isso, entre os desempregados o índice sobe para 64%.
“As desigualdades, especialmente as de raça, são históricas no nosso país e se refletem até hoje. Portanto, digo que não pode haver impacto social sem equidade racial.E esse impacto deve ser mensurado nas avaliações de projetos governamentais e da iniciativa privada. Caso contrário, esses projetos podem ser ferramentas de perpetuação de desigualdades”, comentou Walquíria Tibúrcio.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, 66,6% das mulheres que sofreram violência doméstica e sexual eram negras. Entre crianças e adolescentes, 75% também eram negras.
Mais avaliações e menos desigualdades
Em busca de novas soluções, o GIFE e a Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação (RBMA) elaboraram o ebook Mais Avaliações e Menos Desigualdades. O documento, que pode ser acessado de forma gratuita, oferece uma perspectiva transversal em torno das temáticas de avaliação, equidade e redução das desigualdades.
Sua metodologia busca ser democrática, transparente, intercultural, inter-identitária, e interdisciplinar. Wesley Matheus, coordenador do documento, explicou que a proposta era construir um método “transversal, de modo a enxergar multiplicidade de impactos, danos e efeitos dos projetos objetos de análise.”
Além do esforço conjunto e da inclusão de novas perspectivas, é preciso também superar o medo do surgimento de dados negativos, afirmou Wesley Matheus. “Percebo que há um medo da avaliação, desta mensuração trazer dados que não são exatamente os idealizados pelos projetos”, disse ele, orientando que o medo seja transformado em aprendizado. “Avaliações não são realizadas para punir, mas sim para redirecionar ações, a fim de chegar ao objetivo que tanto queremos: gerar impactos sociais positivos.”
De 12 a 14 de abril de 2023, o 12º Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – debateu as formas de superar as desigualdades que atravessam a sociedade. Se este tema te interessou, clique aqui e confira a cobertura completa do evento.
Apoiada pela Fundação Bradesco, Vale, Fundação ArcelorMittal, Fundação Ford, Fundação Itaú e Porticus, a 12ª edição do Congresso GIFE – Desafiando Estruturas de Desigualdades – também celebra os 35 anos da Constituição Federal e do seu Artigo 5º, trecho que estabelece direitos fundamentais.