A filantropia pode fazer mais no combate às desigualdades

Imagem de uma paisagem externa: uma pessoa ao centro, caminhando numa rua asfaltada e atrás um muro com muitos grafites

Cassio França

Secretário-geral no GIFE

A filantropia e o Investimento Social Privado (ISP) movimentam anualmente no Brasil cerca de 0,2% de seu PIB (Produto Interno Bruto). Um valor baixo se comparado com outros países referência no tema, como os EUA, onde essa porcentagem sobe para 2%. Isso, é claro, não significa que o coração dos estadunidenses é maior que o dos brasileiros. É que, por lá, a prática já está estruturada. O histórico estadunidense de incentivo governamental para que entidades privadas e pessoas físicas contribuam com a sociedade estabeleceu uma cultura da doação. Por aqui, ao contrário, a nossa política tributária inibe a prática, taxando da mesma forma uma venda e uma doação. Em um ambiente extremamente polarizado como o que vivemos, e em um país que voltou recentemente ao Mapa da Fome, essa é uma questão que deve ser revisitada, já que a filantropia pode contribuir muito para o fortalecimento da democracia e para o combate às desigualdades.

 Investimento Social Privado é a destinação de recursos privados para projetos de interesse público. Esse conceito se alinha à  definição literal de filantropia, do grego “amor à humanidade”. É pensar e agir sob uma perspectiva humanista e reconhecendo o nosso papel na transformação do Brasil em uma sociedade mais igualitária. O artigo 6° da Constituição Federal, por exemplo, garante educação, saúde, alimentação, trabalho, lazer, segurança, moradia, proteção à maternidade e à infância e assistência social como direitos indissociáveis ao ser humano. Sem eles, a vida de uma parcela significativa da população – e, consequentemente, a democracia – seguirá em risco.

É óbvio que a filantropia e o ISP jamais substituirão o Estado – e nem é essa a intenção -, mas pessoas e entidades privadas têm o dever moral e político de colaborar com a construção de um país mais justo e equânime. Além disso, existe uma vantagem que o Poder Público não tem: capital flexível. Por ser privado, o recurso tem agilidade para ser alocado na produção de conhecimento, formulação de políticas públicas ou, ainda, para a inovação na gestão pública. Podem ser destinados a quaisquer temas, pautas e projetos.

Ampliar o volume de recursos do investimento social privado e da filantropia é uma tarefa dos agentes do Estado, por meio da revisão da estrutura tributária do país. Para isso, é necessário o respaldo e desejo das empresas e das famílias mais afortunadas, aproximando-se das articulações internacionais que repensam o papel das grandes fortunas no combate às desigualdades. Recentemente, no Fórum Econômico Mundial, um grupo de ultra-ricos se posicionou a favor do fim das desigualdades extremas. Não havia um único representante do Brasil.  Essa ausência, certamente, não está relacionada ao fato de os outros países serem mais generosos do que o nosso, mas de criarmos as condições favoráveis para haver uma grande concertação nacional. Dessa forma, o investimento social privado estará ainda mais próximo de desafiar as estruturas de desigualdades do Brasil.

*Este artigo foi publicado originalmente pelo Valor Econômico em 23 de fevereiro de 2023.
https://valor.globo.com/empresas/esg/artigo/a-filantropia-pode-fazer-mais-no-combate-as-desigualdades.ghtml

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